sexta-feira, 18 de abril de 2014

MATOU QUATRO E FOI ABSOLVIDO

MATOU QUATRO PESSOAS E FOI ABSOLVIDO

Matou quatro pessoas e foi absolvido por ser rico

Publicado por Luiz Flávio Gomes - 1 dia atrás
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O drama do castigo penal (ora barbaramente excessivo, ora escancaradamente leniente) sugere diariamente incontáveis capítulos novos. Vale a pena refletir sobre o tratamento vergonhosamente favorável dado ao jovem Ethan Couch. Ser absolvido de um crime por ser milionário não constitui nenhuma novidade. Que o diga a história da humanidade e da Justiça criminal. Os ricos (especialmente nos sistemas penais burgueses extremamente desiguais) gozam de muitos privilégios, ideologicamente perpetuados nas respectivas culturas. Eles fazem de tudo para não serem nem sequer processados (muito menos condenados).
Beccaria, já em 1764 (no seu famoso livro Dos delitos e das penas), deplorava esse tipo de tratamento desigual. Na época, em relação aos nobres; ele dizia que, sob pena de grande injustiça, os nobres deveriam ser punidos da mesma maneira que os plebeus. A medida da pena, ele afirmava, deve ser o dano causado à sociedade, não a sensibilidade do réu (sua honra, sua fama, sua carreira etc.).
Ethan Couch, um adolescente norte-americano de 16 anos, no Texas, conduzia seu veículo em estado de embriaguez (três vezes acima do permitido) quando matou quatro pessoas num acidente automobilístico. A prisão que seria a reação natural, sobretudo se se tratasse de um jovem negro e pobre. Sendo Ethan de uma família muito rica, a sentença do juiz foi espetacularmente “humanista”. Fundamentação do juiz: “os pais de Ethan sempre lhe deram tudo o que ele queria, e nunca lhe ensinaram que as ações têm consequências. Ocupados com o seu egoísmo e as suas próprias vidas, deixaram-no crescer entregue a si mesmo, sem lhe incutirem bons princípios – um problema típico desse tipo de famílias, segundo o tribunal. O menino foi desculpado, portanto” (expresso. Sapo. Pt/matou-quatro-pessoas-masojuiz-diz-que-naooprende-por-ser-rico=f846069#ixzz2yaUIvs5r).
No Brasil isso já ocorreu incontáveis vezes em relação aos menores ricos (para que destruir o futuro de uma criança ou de um adolescente do “bem”?). E vai ocorrer com mais intensidade se o legislador brasileiro (irresponsavelmente) não resistir à tentação de reduzir a maioridade penal (quando vamos entender que lugar de menores é na escola, não em presídios?). Já hoje praticamente não se vê nenhum menor rico cumprindo a “medida” de “internação”. A Justiça trata os menores milionários de forma diferente; apenas não costumam ser tão explícitos como foi o juiz norte-americano do caso Ethan.
Quando se trata de um pobre, por mínima que seja a infração, a família dele funciona como agravante – mães solteiras, pais ausentes, alcoolismo, dependência, irresponsabilidade, disfuncionalidade; “o menor pobre nasce para o crime”, é atavicamente mórbido etc. Tudo leva o juiz (“imparcial”) a deixá-lo preso (“internado”) um período, para se acalmar. Nem sempre ocorre o programado, mas o sistema penal burguês foi desenhado para discriminar os pobres e marginalizados. O tratamento não é apenas lenientemente desigual em relação ao rico, sim, é desigual da intensidade das sanções contra o pobre. A mesma infração ora é perdoada, ora é punida severamente: tudo depende quem a praticou (essa distinção, extraordinariamente difusa nos países socioeconomicamente muito desiguais, é que era criticada pela sensibilidade de Beccaria).
Luiz Flávio Gomes
Publicado por Luiz Flávio Gomes

Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz…

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22 Comentários
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Achille Arantes
2 votos
Concordo com quase tudo. Se não fosse esta insistência em atacar a dita “burguesia” o texto estaria mais certo.
Há de se pesar que a pena é pessoal, e deve variar conforme a personalidade do criminoso. O que há de se evitar é que este julgamento seja realizado conforme preconceitos e esteriótipos. Afinal eu aprendi que justiça não é tratar pessoas diferentes da mesma forma, mas de forma diferente pessoas diferentes na medida de sua diferença.
Porém no caso, alguma punição seria necessária, pois o elemento ainda representa um risco para a sociedade, pois nada o impede de repetir seu comportamento, e a falta de punição, causando um senso de impunidade pode incentivar que pessoas na mesma situação ajam de forma tão imprudente quanto à daquele rapaz.
No mais, será que se o fato tivesse acontecido em um país comunista e o culpado fosse o filho de uma figura importante no partido (geralmente esses países tem partido único), não aconteceria algo semelhante? Ou seja, o “burguês” do país comunista seria o poderoso, não o endinheirado.
Andrei de Meneses Targino
2 votos
O menor que recebe educação (disciplina, amor, afeto e atenção, além da formação intelectual necessária para ser competitivo numa república capitalista) em casa jamais precisará cumprir medida socioeducativa ou de internação. Como diria uma excelente juíza da comarca em que atuo: “Nunca vi menor chegando neste juizado porque estava rezando no banco da igreja.”.
Concordo com o professor Luiz Flávio quanto ao mérito propriamente dito do artigo, a lei deve ser igual para todos e é para isso que devem trabalhar os operadores do direito, entretanto, vejo com certa preocupação o uso recorrente do termo “burguês” e a crescente cruzada contra a classe média no Brasil. Ora, burguês era o indivíduo que não fazia parte da aristocracia mas que ascendeu financeiramente. No Brasil de hoje, é qualquer pessoa que vive com conforto. Aqueles que calados já estão errados, se abrirem a boca para falar então… “Fascistas!”.
O “homem de bem” existe senhores, não se enganem. Ele é formado desde o nascimento por pais justos mas também amorosos, num lar equilibrado, que ensinam a honestidade e a retidão do caráter como princípios fundamentais para a vida em sociedade. Talvez se todos tivessem acesso a pais assim, o sistema penal se tornasse obsoleto. O que falta no mundo, sobretudo na sociedade brasileira, é amor ao próximo para os tidos como “ricos” e equilíbrio familiar para os tidos como “pobres”. Particularmente desgosto desta dicotomia, acho que ela tira a dignidade e a individualidade do cidadão: Ninguém quer ser o “filhinho de papai”, ninguém quer ser o “pobre coitado”, queremos todos, acima de tudo, respeito.
Luis Claudio
2 votos
Concordo em parte com o texto. O viés ideológico, da eterna luta de classes, está muito arraigado no pensamento do respeitável professor. As pessoas não são soltas porque são ricas. São soltas porque tem bons advogados que acham as “brechas” legais. E mais, o crime por ele cometido não foi intencional, no máximo um dolo eventual. O pobre, a que o professor se refere, geralmente pratica crime doloso, como homicídio, latrocínio, sequestro, e como tal tem que ser punido. Aliás, todos devem ser punidos por seus erros, os ricos e os pobres. Concordo que há desigualdades na justiça e em âmbito social, mas levantar uma bandeira comunista disfarçada de justiça social ai já é demais.
Bruno Tanaka
1 voto
Ótimo artigo, Doutor Luiz.
Eu realizei a leitura do livro “Dos Delitos e das Penas” de Beccaria e com certeza suas palavras são contundentes para os dias atuais. Porém esse entendimento de que ricos não são julgados como iguais aos outros membros da sociedade, na minha humilde opinião está acabando.
Da mesma forma que observamos hoje diversas injustiças, também devemos considerar os avanços do judiciário brasileiro, que de acordo com as suas possibilidades estão fazendo um trabalho digno (da maneira que é permitido) na maioria das suas atribuições. Para uma melhor resolução, deveria existir um estudo mais aprofundado e disponível das resoluções das ações judiciais, sem esta fica extremamente difícil dizer com exatidão a tamanha desigualdade e imparcialidade dentro dos tribunais.
Por fim. Nós cidadãos desta sociedade, devemos contestar as decisões judiciais quando perceptivelmente são injustas. Pois assistir, fechar os braços e apenas reclamar não torna e não reforma o que deve ser renovado. É uma questão histórica cultural a qual devemos mudar e trazer melhoras com a finalidade de obter igualdade entre as pessoas e imparcialidade do julgador.
Charles C
1 voto
Ohh, a culpa é do sujeito que é rico ou do advogado que solta ou juíz que recebe propina? :)
Roberto Duarte
1 voto
Necessário salientar que entre os EUA e o Brasil existe uma diferença muito grande em relação ao Direito Criminal. Nos EUA o Promotor têm poder para negociar sobre os efeitos da condenação. No meu entendimento como Advogado Criminal, faltam detalhes de todo o processo criminal para emitir uma opinião mais abrangente sobre o ocorrido. Qual o acordo feito?
Guilherme Alcântara
Concordo com o texto, vemos nos Tribunais Superiores decisões muito diferentes para casos muito parecidos, muitas vezes, inclusive, no que concerne às indenizações: os autores ricos recebem indenizações superiores às vítimas pobres. Estranho isso.
Isaac Chaves de Souza
Absurdo haver tal abuso…
um juiz desses devia ser exonerado de seu cargo.
“Cidadão de bem” se qualifica por sua conduta e não por seu bolso…
Parece que o ideal de justiça é mesmo só um ideal…
Israel Brito
Sem dúvida, há sim, essa discriminação, quando um menor, não é preciso ser rico, mas apenas de uma família que conhece seus direitos, para proteger o seu menor, afirmando que o mesmo cometeu o crime sem maldades, enquanto de pais pobres são ferozmente acusados, e que ele é produto de seus pais, havendo assim, uma punibilidade antecipada pelo fator riqueza.
Chynna Express Serviçe
Não é nescessário ir tão longe, lá nos States. Aqui mesmo no Brasil, tivemos um caso de um famoso filho de ex-bilionário, com nome de deus nórdico, que atropelou um ciclista com sua Ferrari à 200 km/h e culpou o ciclista por o mesmo estar alcoolizado, e ele apesar de estar a tal velocidade, só tinha tomado uma Coca-Cola.
Jefferson Istom
Se a absolvição foi fundamentada nos pais que lhe deram tudo, então porque os pais não assumem a pena que não foi cabível ao filho? Ofereçam, em sacrifício, os pais, no lugar de seu filho!
Jair Pereira Santos
A segregação entre o rico e o pobre existe desde que é mundo é mundo. Ou seja, nunca o pobre terá o mesmo tratamento do rico. Infelizmente esta saga se perpetuará pra eternidade, onde os menos favorecidos vão ser serventuários daqueles que detêm o poder .
João Cirino Gomes
Só tonto ainda não percebeu que boa parte dos juzes estão vendendo sentenças, ou as trocando por cargos, vejam quantos Lula promoveu! Desta maneira os presidios continuam repletos de pobres, sem poder aquisitivo sem eira e nem beira! E até a estadia destes pobres miseraveis estão sendo superfaturadas para dar mais lucro aos canalhas! Esta é a justiça no Brasil, que esta se tornando a terra de ninguem!
Edson Martins
Mas eu não vejo diferença em casos de adultos. Vemos a justiça dar resultados diferentes para crimes idênticos.
Há casos em que o réu, mesmo confesso, leva anos para ir para a prisão; enquanto há casos em que mesmo sem ter a prova concreta do crime, que é o cadáver, o réu sai diretamente da sala do julgamento para a cadeia.
Por que ?
Teresinha Mohr Winter
Ora, é muito comum neste país, principalmente referente a CRIMES DE TRÂNSITO. Matam e somente “prestam serviços à comunidade”, o que, para a vítima, convenhamos, não importa de que maneira foi morta e, sim, que ESTÁ MORTA !!! E o CNJ existe para que, neste país??? Ainda não disse a que veio. Se é para não cuidar do cidadão nas injustiças que sofre, para que, então, existe??? Maior injustiça sofre a VÍTIMA, que é logo esquecida por todas as nossas “autoridades”.
Geraldo de Oliveira Filho
A contemporaneidade da obra de Beccaria ou de outros pensadores e filósofos, não se deve ao acaso. Deve-se ao fato de a natureza humana ser imutável, isto é, o ser que está humano é falível, falido e corrupto.
Quero com isso dizer, que o juiz que julga com leniência o rico, não o faz por mera simpatia à condição socioeconômica privilegiada do réu e sim por haver em seu inconsciente que o futuro é uma porta fechada atrás da qual ele não sabe o que há.
Talvez, um dia, possa usufruir da complacência do pai agradecido.
Não creio que haverá mudança no que vemos hoje e que Beccaria via em 1.764, posto estarmos humanos.
Marcelo Pereira da Silva
Entendo seu artigo como uma revolta ao sistema jurídico, e fico muito triste com a forma que apresenta nossa realidade jurídica. Mas devo admitir que você tem um pouco de razão e tem que expor mesmo. Devo também concordar com a separação entre pobre e rico dentro da justiça brasileira. Acho que devemos sim manisfestar nossa opinião a respeito do assunto. Se bem me lembro tem um princípio na Constituição Federal que garante que os DIFERENTES sejam tratado com suas DIFERENÇAS e os IGUAIS com suas igualdades. mais ou menos isso.
Dessa forma quem tem muito dinheiro é diferente de quem não tem e vice- vessa.
Um abraço : Marcelo Pereira
João Luiz
É absolutamente certo, este pensamento, por um lado temos os operadores da justiça o homem da capinha, o super homem, o dono da razão que sabe que ao se julgar um pobre ele pode aplicar todo o poder da lei, esmagar com a mão de ferro, pois o miserável sequer pode constituir um advogado, e quando consegue é um meia boca que só vai lhe tirar o pouco tiver e o resultado será o mesmo, ser esmagado, e o todo poderoso dono da razão dirá que foi respeitado o direito de defesa; por outro lado o senhor de engenho, um dignatário do poder econômico, uma pessoa acima da maioria da sociedade (sociedade= grupo de pessoas que vivem em comunidades interindependentes, com propósitos e esforços comuns em prol da coletividade, respeitando suas individualidades), uma virtuose acaba por ter a virtuose, jr seu sucessor, mais um grupo de delinquentes da mesma laia, a brincar de atear fogo em pessoas, que dormem nas ruas pois a parte da sociedade que lhe sobrou só dá para dormir em algum ponto de ônibus, infelizmente foi vítima da high Society, morreu de uma forma horrível, portanto não deu para julga-lo pois morreu, então vamos julgar os delinquentes, filhos de Ministro do TSE,Juiz Federal,Funcionários público Federal; foram a júri popular,condenados a 14 anos,foram pro semi aberto após cumprir 1/6 da pena; não voltavam pro xadres para dormir, pois iam pro happy hours, e depois iam dormir em casa, oito anos após estavam totalmente livres, e receberam a “reabilitação”= limpeza de suas fichas criminais, quer dizer não fizeram nada que os desabonem, só mais um fato verídico de pessoas acima de todos os outros, tanto das Leis quanto da Sociedade – vide “Indio Galdino – 1997″
Abel Compri
Olha aqui uma ótima comparação do pobre e o rico,, todo o rico vai para o Céu, e o pobre para o inferno, a família do rico manda rezar uma missa com o Bispo e a igreja lotada com mais de hora de falatório, o pobre manda fazer uma missa com o padre na igreja da periferia e quase não vai ninguém e e o padre só fala umas palavrinhas, porem até ai já a diferença os pobres vão todos para o inferno e os ricos para o Céu.
Joaquim Pereiratellesneto
Cada vez mais perco a fé na humanidade; caminhamos para a autodestruição.
Tenho certeza, também, que lugar de menores é na escola.
Floriano Lott
Não é só com os burgueses. Houve quem lutou com armas contra a burguesia, matou mais de quatro, nem foi a julgamento pelas mortes e ora estão no píncaro da glória.

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